sábado, 31 de dezembro de 2011

Faça como Aristóteles e defina o seu tempo, o seu movimento e a sua alma

Por conta de um comentário de uma querida amiga sobre o tempo, comentário este feito em uma rede social, lembrei-me de Aristóteles. Minha amiga, sempre muito refletiva, especialmente neste final de ano, postou algo sobre o tempo. Assim como ela, é natural que, em dezembro, façamos essas mesmas análises e reflexões. O que é o tempo? Para o filósofo Aristóteles, que estudou quando criança na escola dirigida por Platão, em Atenas, existiam algumas condições necessárias para se perceber o tempo. Segundo ele, para que o tempo exista, o mesmo deve se relacionar com o movimento e com a alma. Movimento seria Deus, o "motor" maior que impulsiona a vida e faz o tempo acontecer. A alma seria a responsável por fazer com que percebamos o tempo através de seus sentidos. Aristóteles afirma que todo movimento se dá em um determinado tempo que o define e que este tempo só poderá ser percebido através da alma. Sendo assim, apenas os humanos percebem o tempo, pois são os únicos seres vivos a possuirem uma alma. Sem entrar na discussão sobre se os animais também possuem alma (eu garanto que meu cachorro tem uma), minha proposta aqui, no Vide Letra, é pegar o gancho da minha querida amiga e de Aristóteles para propor uma reflexão. Uma pausa para pensar no tempo. O tempo que gastamos, que aprovetamos, que consumimos e, principalmente, o tempo de agora, o presente, que une o passado e o futuro. Nosso filósofo, em seu tratado sobre física, tentou definir o tempo. Acho que podemos tentar imitá-lo e definir o nosso próprio tempo, o tempo particular. Na linha de Aristóteles, teremos uma força maior do nosso lado (que pode ser Deus, se assim for melhor para você) que fará com que nosso movimento seja permitido e possível e que nos levará ao encontro das transformações necessárias para o nosso progresso. Este movimento será sentido por nossa alma e nos apresentará a nossa essência, essência que justificará nosso tempo terráqueo. Graças a minha amiga, refleti sobre o tempo. Graças à Aristóteles, pude pensar em nossos movimentos, sentidos por nossa alma e aproveitados pelo nosso tempo. Então, mova-se! Deixe que sua alma sinta suas atitudes e tenha um novo tempo fascinante. Feliz 2012, em seu devido tempo.

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Acontece que é felicidade sem fim

Sem fim. Felicidade não tem fim. Felicidade se herda, pois se transmite e, por isso mesmo, ela não tem fim. Passe a sua felicidade as pessoas ao seu redor. Sorria na rua, no trabalho e em casa. Seja positivo e tudo isto não terá fim, a tal da felicidade. Você pode fazer com que a felicidade cresça ainda mais conforme os "nãos" aparecerem, pois eles apenas comprovarão que a felicidade existe. Existe e deve ser sentida, compartilhada, divulgada e, principalmente, ensinada. Deixe sua herança mais preciosa, a felicidade, aos que tiverem que se sustentar quando você se for. É a felicidade deixada por você que fará com que eles sigam em frente. E esta mesma felicidade, como um presente de gerações, será transplantada para os próxmos e próximos. Sem fim. É natural que a felicidade não esteja presente em todas as horas, mas ela é como a jóia deixada pela vovó e que você usa quando quer ou quando precisa. Mas ela está lá, a felicidade, em um escaninho. Se quiser usá-la todos os dias, melhor ainda. Tem gente que consegue usar jóias todos os dias. O importante é você se transformar em um motivo de felicidade, em uma lembrança que seja gostosa de se ter. Seja uma memória que traga sorriso, satisfação e força aos seus herdeiros. Assim, quando eles lhe evocarem, você será sem fim. Você será a felicidade.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Uma ceia com convidados especiais

É, novamente, hora de reunir a família e os amigos ao redor da árvore de Natal e distribuir dedicações e apreços a quem, verdadeiramente, nos é importante. Todo final de ano convidamos para a ceia pessoas queridas e que são a razão de nossa felicidade. Dividimos com elas nosso pão e nosso amor, pois somos invadidos por um sentimento cristão especial. Por este motivo, sugiro que, neste ano, você aumente a sua lista de convidados para que a sua ceia seja ainda mais calorosa. Além disso, tenho a impressão de que as pessoas irão adorar. Você pode, por exemplo, convidar Fernando Pessoa e sentá-lo à mesa ao lado de sua tia solteirona para que ela, além de saborear o peru, possa escrever com ele cartas de amor ridículas a um futuro namorado. Também poderá incluir em sua lista de convidados Miguel de Cervantes e apresentá-lo a um tio depressivo que, há muito, deixou de enfrentar os moinhos da vida e que não parte mais para nenhuma batalha. Dou cinco minutos de conversas entre eles para que seu tio volte a vestir a armadura e sair cavalgando. Quanto ao seu sobrinho chato, arredio e que tem urtiga nos fundilhos, basta chamar Monteiro Lobato. Duvido que as reinações de um sítio habitado por boneca de pano e burro falante não o acalmem. Para seu irmão jovem e cheio de energia, convide Alexandre Dumas e transforme-o em um mosqueteiro. O vizinho gosta de contar mentiras de pescador? Não tenha dúvidas: convide Herman Melville. Ele tem um história de pescador que envolve uma baleia gigante que deixará seu vizinho morto de inveja! A companhia ideal para o vovô que já é um sábio é Thomas Mann. Eles perderão horas numa discussão sobre o humanismo. Só não recomendo uma companhia como Goethe para alguém que está sofrendo por amor. Se ele começar a falar sobre um jovem chamado Werther, a ceia poderá acabar em tragédia! E então? Não é uma boa sugestão? Entre panetones e chesters, podemos dividir o alimento literário que desde antes do nascimento de nosso Senhor já existia e unia os homens de boa vontade. Paz de Cristo! Divirta-se!   

domingo, 11 de dezembro de 2011

Encontro com um ET

Ontem, 10/12, aconteceu no B_arco Centro Cultural, em Pinheiros, um dia de autógrafo do Lourenço Mutarelli para lançar seu novo livro (e marcar seu retorno aos magníficos quadrinhos depois de 10 anos de afastamento) "Quando meu pai se encontrou com o ET fazia um dia quente", Companhia das Letras. Fui até lá para conhecê-lo pessoalmente e lhe dar um abraço. Foi um encontro extraterrestre. Acompanho há tempos a obra do Lourenço e ela sempre me perturbou muito, uma boa perturbação. Não foi dferente com este novo livro, que conta a história de um senhor, aposentado, que passa seus dias desmontando e montando máquinas de escrever e de costura e que perde a esposa em um trágico acidente. Com a vida abalada pela morte da companheira, o processo de isolamento se inicia. A rotina (e o esforço) de dormir e acordar orando para que suas vidas não mudassem em nada (ideia passageira, obviamente), bem como o hobby de desmontar e montar as máquinas, já não fazem mais sentido quando ele se encontra viúvo. Até que um dia, ele conhece um ET. Com isto tudo, Lourenço nos leva a refletir sobre as mudanças drásticas e inevitáveis que acontecem em nossas vidas, o encontro com nosso destino implacável e, mais do que isso, o encontro com nossos ETs interiores. Aquele sentimento novo, inédito, ocasionado por um fato também inédito, irá se transformar em um ET, em um ser que nunca vimos, nem nunca ouvimos. Para as perdas do futuro, não há preparação. Talvez haja algo que possamos fazer para que as recebamos de maneira mais suave e compreensiva, mas não somos donos de nossos destinos. A realidade crua e seca do Lourenço sempre me atraiu demasiadamente. Sua perturbadora visão do mundo, seus desenhos e prosas que não têm hora para serem apreciados (no café da manhã, no domingo ou na sala de espera de um consultório, suas histórias serão indigestas da mesma maneira) sempre me passaram uma cor cinza de concreto de cidade grande que me emociona. É a vida com seus ETs de presente e muito reais. Ontem, encontrei um ET e estive com ele por alguns minutos. Um ET que há muito está em mim, transformando-me desde que sua obra me arrebatou. Um ET original chamado Lourenço Mutarelli. De uma maneira bem especial, Lourenço me ensina como viver com meus ETs. Divirta-se!

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Elza, uma verdadeira Fitzgerald

De F.Scott Fitzgerald podemos dizer que sua "sombra" lhe dava segurança, companhia, apoio e, mais do que qualquer outra coisa em sua vida, completava-o, em uma simbiose magnífica. Sua "sombra" tinha nome, chamava-se Elza. E sobrenome: Fitzgerald. Também tinha uma posição mais do que honrada. Foi sua esposa até a morte. Morreu em um incêndio, num sanatório em uma das muitas internações pela qual passou. Elza era esquizofrênica. Seu corpo só pode ser identificado pelo sapato que ela usava no dia de sua morte. Elza sempre lutou para sair do espaço secundário em relação ao marido e que garantia a este a segurança e o material para escrever. Tentou as artes. Enquanto bailarina, sua professora dizia que ela já não era tão jovem para dançar, mas que, com tanta dedicação demonstrada, conseguiria se apresentar. F. Scott Fitzgerald interferiu e fez com que qualquer apresentação da esposa fosse vetada, alegando que o incentivo poderia agravar seu quadro pscótico. Começou a pintar, chegou a expor seus quadros, mas as obras não foram reconhecidas com valor. Elza passou a vida lutando contra sua doença mental e tentando tornar-se alguém com reconhecimento próprio. A luta do casal contra o álcool, as brigas constantes e os diversos interesses de Scott Fitzgerald por outras mulheres fez com que Elza acumulasse enfermidades. Ela chegou a finalizar um romance, o seu único romance, chamado "Esta Valsa é Minha" e, novamente, seu marido proibiu quaisquer estímulos positivos  que fizessem com que Elza ganhasse sua propria fama e dinheiro. Na verdade, eles se fundiam em um. O externo quase não existia para eles. Eles se respiravam e a obra de F. Scott Fitzgerald teve como personagem principal, Elza Fitzgerald. Ela foi sua inspiração e tema, a força propulsora para que seus textos tivessem vida. E, mesmo assim, foi uma mulher que morreu tentando não ser a gêmea de seu marido. É um dos clássicos casos onde a mulher representa quase a totalidade da fama e do talento de seu companheiro. Talvez F.Scott Fitzgerald não apresentasse o sol na clareira para Elza por egoísmo, por medo ou por alguma combinação entre eles, mas uma coisa é certa: existem várias Elzas pelo mundo, várias "sombras" que, na verdade, criam e divulgam o novo e as revoluções.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Na minha época...

Ah! A minha época. Que saudades! Na minha época tudo estava em ordem e reinavam felicidade e tranquilidade sociais. Não sei se você conseguirá compreender tão áurea época, mas era uma época em que coisas absurdas como preconceito, assassinato, vingança e desamor não existiam, eram inimagináveis. Para você começar a ter uma ideia de como era a minha época, vocábulos hoje tão utilizados (e praticados) como separatismo e individualismo não constavam em nossos dicionários. Ah! A minha época. Eramos uma única raça, de homens, a raça humana. Sabiamos distinguir a raça humana das outras raças, que eram as raças de nossos amigos, os animais. A raça humana tinha algumas peculiaridades, como braços, pernas e cabeça em formatos diferentes das outras raças, que eram as raças de nossos amigos, os animais. Nós, da raça humana, comparávamos divertidos nossas diferentes alturas, cores, cheiros e sexos. Adorávamos perceber como essas variedades nos atraia e nos apaixonava. Com os amigos de outras raças, os animais, não era diferente. Eles também possuiam cores, alturas e cheiros diferentes. Era assim, em minha época. E éramos felizes. Os seres vivos, humanos e animais. Pra você continuar a entender como era a minha época, dou-lhe alguns exemplos. Nossas crianças não precisavam se defender de agressões de nenhuma espécie por parte dos adultos, pois estes zelavam por elas, haja vista que elas representavam a nossa extensão e o nosso futuro. Nossa religião era amarmos uns aos outros da maneira que o amor viesse. Nosso ar não era venenoso e os rios que banhavam a todos matavam a nossa sede. Não existiam doenças que implodiam o doente como se ele fosse uma grande bolha de pus. O toque entre os seres vivos existia para abraçar, cuidar, dar carinho e fazer amor e não para esganar ou matar. Ninguém pensava em levar vantagens ou elaborar armadilhas de vingança contra supostos ameaças ou ódios. E um olhar era apenas um olhar, sem intenção expiatória. Todos tinham seu lugar, os animais e os de nossa raça, os humanos. Ah! A minha época. Bem, eu poderia redigir um longo relatório sobre a minha época. Caso você queira algo mais detalhado, com mais informações, basta dizer. Pediram para que eu lhe enviasse este informe porque dizem que aí, na sua época, as coisas não andam muito bem. 

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Dezembro, mês de começar

Quase o número 12, novamente e mais uma vez. Quase dezembro de um ano que poderá ser lembrado pelo 100o. gol de Rogério Ceni ou pelo conflito no Egito.  Pode ser, também, o último ano de nosso calendário se a profecia Maia se cumprir e nossa mãe Terra for para o "espaço". De qualquer maneira, é cedo para falarmos em retrospectiva 2011. Não é dezembro e o ano ainda não acabou, e não estou a fim de fazer com que o tempo passe mais rápido do que ele, aparentemente, já está passando. Também porque acredito que quem passa somos nós e não o tempo. O tempo está sempre aí, esperando quem vai chegar. Sendo assim, ainda temos dezembro para iniciarmos algo que protelamos ao longo do ano. O tempo é o mesmo, em dezembro ou em janeiro. Nenhum desses dois meses representam o fim ou o começo quando se trata de decidirmos o que queremos para nós. O tempo certo para erguermos a cabeça e falarmos para o universo o que queremos ser e fazer é agora. Aquele livro que não começamos a escrever, o planejamento de uma nova carreira, o pedido de desculpas ao vizinho ou aquele "eu te amo" engasgado, todas essas ações estão prontas para existirem desde já. E digo mais: elas terão mais poder e sinceridade quanto antes elas forem concretizadas. No futuro, pode ser que resida um arrependimento horroroso, um dó de nós mesmos por passarmos pelo tempo sem darmos ouvidos às nossas verdades. Promessas de início de ano só postergam o que, de fato, precisamos fazer agora. Início de ano é para ser comemorado com realizações concretas, e não com juramentos superficiais. Façamos com que dezembro seja um mês de início, de começo de progresso e de amor por nós mesmos.

domingo, 20 de novembro de 2011

Vida : doce como um sonho

Doce, cremoso e tem o tamanho necessário para transbordar a sua vida de realidade. Este é o sonho da padaria da esquina, aquele que enche a sua boca d'água e os seus olhos de brilho quando flerta com você da vitrine de onde se exibe. O sonho traz, com o poder de seu sabor, a realidade que você quer usufruir, aquela que é despertada quando você se depara com ele. De frente para o seu sonho, você tem a visão do que lhe proporcionará felicidade e prazer. É o seu sonho que lhe guia e lhe desperta para que você saiba o que fazer da sua vida. Sem o sonho, não há objetivo, nada lhe moverá para o sucesso e para a paz. Ouça, veja, sinta o seu sonho. A decisão é sua de abocanhá-lo, de saboreá-lo e de enguli-lo. Não se esqueça de dividi-lo com as pessoas que forem importantes para você, pois, desta maneira, elas também irão mostrar-lhe os seus. Sinta orgulho de seu sonho, de seu tamanho, de seu cheiro e de seu formato, pois ele é você. Se, nas diversas trajetórias até a padaria onde você encontrará o seu sonho, ele mudar repentinamente de formato ou de cor, não há problema. Significa que outro sonho está lhe namorando e necessitando de sua atenção. Se assim for, vá até ele e morda-o. Agora, abra os olhos e acorde para os seus sonhos. Tem uma padaria bem próxima a você cheia deles lhe esperando. O nome da padaria? VIDA. Divirta-se. 

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Há um processo contra você : CULPADO!

Conheci Franz Kafka através de uma de suas maiores obras: O Processo. Li este livro no início dos anos de 1990 e lembro-me de como ele me afligiu, de como sua história me deixou com uma sensação de "culpado". Kaka, um judeu tcheco que escrevia em alemão, preencheu, neste romance, suas personagens de dor e angústia, infligindo-lhes culpa e perseguição por conta de um sistema burocrático e cheio de imposições. Um sistema composto por leis e dogmas e que, sem nenhum motivo ou explicação, ordena e classifica os indivíduos e suas pequenas e escuras vidas. Este é o universo ordinário de Kafka. Cheio de ironias e culpas mandadas. Um universo que é capaz de criar um processo e inseri-lo na vida de qualquer cidadão. Mais do que nunca, O Processo de Kafka está nos tempos vigentes. Há processos nos regendo todos os dias em quaisquer circunstâncias. E, normalmente, o veredito final desses processos é : culpado. Somos culpados por sermos gordos, por sermos magros, pelo nosso gênero sexual, por possuirmos determinada cor de pele, por pertencermos a um grupo étnico específico e até por nosso saldo bancário. O dedo do processo está sempre apontado para nós. Há qualquer momento você poderá ser considerado culpado por ser assim, exatamente como você é. As imposições do sistema em que vivemos estão aí, pulsando contra nós. E o pior: elas são originárias de nossa postura, nascem do que achamos que é necessário a nós. Perigoso e fatal. Criamos nossas próprias armadilhas e somos culpados por elas. Movemos processos diários contra nos mesmos e contra os outros. É a realidade mundial. É a realidade de Kafka. Se Deus quiser, um dia eu quero ser índio...A propósito: o desenho que ilustra minha postagem é de Kafka. Divirta-se!

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Artigos e ensaios

Escrever é mais do do se fazer ler. É mais do que transmitir uma mensagem ou deixar um recado. Escrever é cativar, é prender o leitor pela emoção e, acima de tudo, é doar-se. Na revista Serrote no. 9 que acabou de sair, há um ensaio espetacular da americana Cynthia Ozick sobre as diferenças entre artigo e ensaio. Fiquei tão maravilhado com o texto que resolvi expor minhas sensações aqui, no Vide Letra. Cynthia diz que o ensaio é "uma mente livre quando brinca", e nada pode ser mais verdadeiro do que esta afirmação. Sobre as diferenças entre artigo e ensaio, ela menciona que o artigo é momentâneo, passageiro, um flash, uma foto que em dias estará obsoleta. É, ainda, uma notícia, um acontecimento que será substituido por outro na próxima semana. Quanto ao ensaio, sua conclusão é mais poética. Para Cynthia, o ensaio é imaginação e toda informação contida nele é corriqueira. O ensaio não serve para doutrinar ninguém, muito menos educar. O ensaio não se prende a sua data de nascimento como o artigo e torna-se uma espécie de ideia eterna. O ensaísta, como todo bom poeta, escreve com as artérias do coração. O leitor não tem que concordar com o que um ensaísta escreve, mas emociona-se e torna-se reflexivo quando lê um bom ensaio. O verdadeiro ensaísta pode lhe passar uma sensação de solidão, caso você esteja sozinho em companhia das estrelas, por exemplo, mas também pode lhe dar a percepção de estar bem acompanhado caso caminhe, sozinho, em um bosque. Note que, tanto as estrelas quanto as árvores do bosque, oriundos da natureza, poderão lhe fazer ou não companhia. Tudo dependerá do direcionamento que o ensaísta der ao texto. Você estará em boa companhia, caso eu lhe indique, através de um ensaio, um livro cujo tema lhe conforte e lhe dê prazer. Mas também poderei fazer com que você se sinta isolado e triste dizendo-lhe que a única coisa que realmente conforta e dá gozo é a companhia e o calor de uma alma idêntica a sua. Como disse anteriormente, o ensaio não doutrina e nem tem a pretensão de ter créditos perante todos os leitores, mas ele faz com que todo leitor concorde com seus termos e conclusões. Doe-se a sua escrita. Ensaie. Divirta-se!

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Alerta: sua vida já começou!

Sua vida já começou. A HQ (para quem não sabe, história em quadrinhos) "Daytripper" dos gêmeos paulistanos Fábio Moon e Gabrel Bá que acaba de ser lançada no Brasil pela Panini após ser premiada nos EUA e ocupar o posto de HQ mais vendida no New York Times, mostra de maneira lírica, colorida e certeira que o "grande dia" ou "o grande acontecimento" de nossas vidas já são reais. Ou melhor: eles foram e serão eternamente reais e consecutivos, quase intermitentes e sem fim. Pela história, acompanhamos Brás, um escritor de obituários que (vou contar sem estragar a graça da narrativa) morre no final de todos os capítulos. Em cada capítulo ele tem uma idade, que não segue a ordem cronológica, mas mantém a coesão entre personagens, lugares, etc. Brás aguarda o "acontecimento de sua vida", aquele que dará sentido e razão a sua existência. Vive na expectatva do "grande dia", do dia em que sua vida, efetivamente, começará. Seu objetivo: tornar-se um escritor de renome. Com esta ideia fixa, Brás não percebe as coisas que lhe acontecem diariamente, ou simplesmente não dá importância a elas por serem comuns demais, corriqueiras demais. É cego em sentimentos e valores e não nota que, cotidianamente, o que ele tanto espera, está pulsando. Em um lindo momento da HQ, seu pai reza: a vida é feita de momentos e são esses momentos que devemos levar conosco, pois eles representam o que vale a pena em nossas vidas. Daí vêm as perguntas: o que esperamos acontecer? Qual é o evento, o episódio que nos arrebatará e nos levará ao sétimo céu? Será que ele já não aconteceu? Será que não acontece diariamente? Quem vive esperando alcançar algo (seja lá o que for), alcançará um dia? Sabemos onde queremos chegar? E quando chegarmos, será que saberemos que lá chegamos? Onde é "lá"? Loucura! Já estamos lá! Já chegamos! Estamos vivos, não estamos? O grande acontecimento está aí, ao seu lado, basta estender a mão e tocá-lo. É seu filho que nasceu. É o sol que nos aquece depois de sermos tragados pela escuridão de uma noite fria. É o pé de flor que você encontra antes de chegar ao trabalho onde terá a reunião orçamentária com seu chefe. É o amigo que lhe sorri quando você, sem querer, chuta a bike na academia e ganha um dedão roxo. É, acima de tudo, você. VOCÊ é o grande acontecimento de sua vida. E o seu grande dia foi o dia em que você nasceu. Olhe pra você. Sinta-se. Veja que tudo já começou e está passando, acontecendo. E tudo é muito bom! Perceba o quão importante você é quando faz alguém sorrir, quando cria algo bonito, quando ajuda alguém ou, simplesmente, quando respira. Relembre seu primeiro beijo na boca e me responda: a vida não começou? Divirta-se!

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Meu Herói

Quando eu era criança, tive a sorte de ter um pai que lia para mim. Lembro-me de meu nobre papai decifrando as letras que, naquela época, ainda me eram impenetráveis, desconhecidas. Lembro-me da mágica de meu pai, pois, além dele saber de tudo (quando eu crescer, quero ser como ele), ainda conseguia entregar-me uma realidade vertiginosa e com enormes possibilidades de aventuras, aventuras estas que iam além das patéticas emoções que quaisquer brinquedos de pilha poderiam ter me dado. Havia aventuras de animais, de meninos sapecas, de dia de Natal. E havia as de super-heróis! Ah! As aventuras de super-heróis! Era com essas que eu me deliciava! Com elas eu era forte e sempre tinha um plano para combater meus inimigos. Tinha minha capa voadora que me protegia dos tiros e dos raios maléficos e que me levantava bem alto, acima dos telhados e das árvores. Qualquer arranhão no joelho era curado pela voz heróica de meu pai em uma próxima história. Eu possuia uma máscara que me deixava invisível quando eu tinha que passar por algum lugar perigoso, cheio de monstros. Eu defendia minha casa dos bandidos que por ventura pudessem fazer mal a minha família, ao meu cachorro e aos meus brinquedos. E era feliz como uma criança-herói podia ser feliz. Hoje, esses poderes ainda me pertencem. Ainda sobrevoo a cidade procurando o meu lugar. Consigo ser invisível quando a situação exige que eu seja parcimonioso e tenho, no peito, um escudo para enfrentar o dia a dia e defender a minha família em momentos que solicitam maiores cuidados.
O motivo desses super-poderes ainda estarem comigo é simples: as aventuras que meu pai lia para mim ainda me acompanham. A diferença é que, atualmente, eu consigo lê-las sozinho. Em minha literatura está todo o poder que, um dia, meu pai me passou. Graças ao alimento feito de letras e atenção que ele tão sabiamente me deu, sou um homem saudável e forte. E mantenho a doce lembrança da mágica de meu pai a cada leitura que inicio. Ah, sim. Meu pai-herói ainda está comigo e é o maior colecionador de gibis do Batman que conheço. Divirta-se!

sábado, 22 de outubro de 2011

Que cabelo você necessita?

Saber o que é necessário para vivermos, hoje em dia , é quase impossível de ser definido. E não estou falando de obviedades como comida, água e teto (se bem que existe gente sem teto, mas enfim), e sim dos supostos excedentes, dos supérfluos que tantas possibilidades nos dão em todos os sentidos. Os demasiados que, até pouco tempo, eram considerados objetos luxuosos e não tão necessários para, literalmente, sobrevivermos, atualmente ocupam os primeiros lugares na lista das coisas que precisamos possuir, mesmo que, depois, essas coisas nos escravizem. O novo livro do argentino Alan Pauls, "História do Cabelo", editora Cosac Naify, ao mesmo tempo que nós dá uma ideia do que foi a Argentina nos anos 70 através do protagonista que vive em conflito com seu cabelo, tem a proposta de apresentar o peso que nos impomos quando possuimos algo que devemos manter e cuidar. Algo que assumimos como definição de nós mesmos e que se torna maior do que nós. O cabelo, no caso do protagonista (ele não possui um nome no livro e isso é genial), influencia-o e altera suas ações diariamente. O cabelo dita sua postura, sua inclinação política e seu estado de espírito, além de representar um fardo por exigir cuidados e atenção. Ele pensa no cabelo como outros pensam na morte. Com o universo que esta frase representa, temos noção em qual terreno caminharemos durante a leitura. Cortar o cabelo ou não cortá-lo, sua aparência após o corte e a maneira de usá-lo que, plasticamente, definirá sua personalidade, leva-nos a refletir sobre o que somos e o que precisamos ter para obtermos uma certidão individual. Nossa realidade está repleta de periféricos e tecnologias mais do que necessárias para trabalharmos, cuidarmos da saúde, sociabilizarmo-nos, etc. Um carro com opcionais de segurança mantém nossa família mais tranquila em um passeio. Um computador com as últimas versões de um software poderoso conecta-nos aos amigos e aos nossos colegas profissionais. O perigoso é quando essas coisas começam a nos dar forma, quando se transformam em "deuses" venerados e nos moldam. Somos mais do que as coisas que o homem inventou. Vergar-se a fútil necessidade de possuir algo apenas por possuir é servir ao material invetando por nós mesmos. Somos essência e vida. Somos superiores quando decidimos o que queremos. O meu cabelo é usado como eu quero, e não da maneira como ele se comporta em minha cabeça. O comportamento é meu. A cabeça é minha. Corte seu cabelo, e não sua cabeça. Divirta-se!

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Não saber para crescer

Clarice Lispector deixou-nos uma obra incomparável em termos de literatura da alma. Ela é tão única que parece que veio de um mundo que não é o nosso. Até que nós a conheçamos. Quando digerida, sua obra nos transforma em seres diferentes do que outrora fomos. E daí somos nós que acabamos por pertencer a outro plano. Quantas vezes nossa Clarice disse que escrevia palavras tão lindas e que nem sabia quais significados tinham? Quantas vezes ela nos firmou que o momento mais belo é o da inspiração gerada pela dúvida?. Quantos "por ques" ela repetiu para nos dizer : nunca pare de buscar, de querer, de aprender e de crescer? Os "por ques" e as dúvidas são as molas propoulsoras que nos lançam, sempre, cada vez mais acima do lugar que estamos, melhorando-nos. Saber tudo é morrer. Saber tudo é virar pó estático. Uma coisa eu acho que sei. Trocar o que se tem de bom, é bom. É bom porque, quando assim o faço, sinto-me bem. E aprendo com quem eu troco. Eu quero estar inspirado todos os dias. Eu quero ter a coragem da sinceridade para poder dizer a mim mesmo : faça, vá, ouse, aprenda. E cresça. Cresça para dividir. Quero escrever palavras bonitas, como Clarice, e nem saber o que elas significam, porque não o saberei de qualquer maneira. Quero calcular construções que cheguem às nuvens, mas quero-as altas. Eu não sei nada. Quando souber algo, estarei morto. Divirta-se!

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Um amor definido

Temos uma preconcepção quando queremos definir o amor, mesmo sabendo que ele tem várias formas. Apesar disso, somos unânimes em dizer que ele é o maior dos sentimentos e o único que pode dar sentido às nossas vidas. O livro autobiográfico de André Ranzatti, "Amores no Masculino", relançado pela Editora RDG (da qual faço parte como colaborador e revisor), conta-nos uma história de coragem e de autoconhecimento para nos mostrar a trajetória do autor na busca pela aceitação e pelo entendimento de seu amor que, infelizmente, ainda é considerado por muitos como "engano de amor" ou "não-amor", já que se trata de amor entre pessoas do mesmo sexo. Como disse, somos capazes de imaginar o amor como o maior sentimento humano, nobre e de significado sacro, mas para muita gente, tristemente, um amor como o do André nao é amor. É desonra. O livro de André é doce, é gentil, é alegre e sincero, e, por ser assim, rebate o preconceito sexual e comprova que o amor não tem apenas uma definição. Ele é real (e isto é o que importa) quando é honesto e abraça as pessoas ao seu redor, transmitindo paz e bem estar. Não pense que você irá encontrar páginas suadas de sexo ou pornografia (não que isto seja dispensável ou sem valor, pois até o sexo por prazer é válido, apenas não é o foco do livro), mas uma história cheia de perspectiva, bom humor e, principalmente, de amor verdadeiro. O André conseguiu definir o amor a sua maneira, fazendo a sua parte ao divulgar tão construtivo sentimento. Se fizermos a nossa, as sociedades estarão livres do preconceito e da falta de irmandade que tanto chacina nossa espécie. Eu e o André estamos juntos a quase 4 anos e 9 meses, definindo e divulgando um amor que acreditamos ser puro. Tentamos mostrar às pessoas que nosso companheirismo vale a pena e que qualquer significado que o amor tenha, por si só, será um amor definido. Divirta-se!

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

A raiva do amor

Há um artigo do José Renato no site da Livraria Cultura desta semana (http://www.culturanews.com.br/) que me fez ter noção de uma caracteristica do amor que, até então, eu não tinha (ou tinha, mas inconscientemente): a raiva que o amor pode despertar em nós em relação as pessoas que nos são próximas. Sim, pessoas muito próximas e que amamos, às vezes, incondicionalmente, como nossos pais ou nossos filhos. Eu sei das afirmações quase clichês como "o amor está a um passo da raiva" ou "o amor e o ódio andam de mãos dadas", mas não é a isto que o texto do José Renato se refere, e sim à raiva originada pela convivência com alguém amado. Por exemplo: quantas vezes você já não teve vontade de dizer (se é que não o disse) "mamãe, a senhora é um saco!", ou "meu filho, eu vou esganar você!", ou ainda "eu odeio meu marido!"? O texto do José Renato fez-me notar algo que não havia percebido. Não sei se é certo classificar como raiva o que sinto, mas que em diversas ocasiões eu me surpreendo sem paciência em relação as pessoas que amo e que encontro constantemente (amigos, parentes, etc), isto é fato. E, na maioria das vezes, por motivos banais. Aliás, quase sempre por motivos banais. Talvez a falta de paciência (ou a raiva, como diz o José Renato) aflore com mais facilidade em relação aos nossos queridos porque eles representam um terreno seguro onde podemos desabafar, xingar e bater o pé com a ingênua segurança de que eles não irão nos abandonar. Disse ingênua segurança porque acho que até o amor tem limites, nesse aspecto. Se, quando sentimos raiva, apresentamos às pessoas que amamos tudo de ruim que possuimos, além de raivosos, seremos estúpidos? Apenas por acharmos que as pessoas especiais em nossas vidas aguentarão nosso mau humor e ódio porque elas nos amam, isto nos envolve em alguma espécie de direito de extravasar nossa ira sobre elas? Se a convivência gera raiva, se a constância de encontros entre duas pessoas que se amam pode ocasionar raiva, acho que a internet trará a solução, pois ela mantém as pessoas distantes, aparentemente, fisicamente. Claro, estou sendo irônico. Se a raiva aumentar, acho que nem a internet conseguirá separar uma briga. Até!

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Um Senhor exemplo

Pense em um super-heroi. Melhor: pense em um idólo, naquele ídolo que você é fã incondicional, que admira, que gostaria de ter em seu rol de amizades e que, pra você, é exemplar. José Mindlin, nosso maior blibliófilo, preenche-me de todas essas maneiras. Morto no dia 28 de fevereiro de 2010, deixou-nos uma blibioteca com milhares de títulos, biblioteca esta que começou ser formada quando Mindlin contava com 13 anos de idade. Nesta mesma época, sem ele saber, iniciou-se a sua "patologia" em colecionar livros. Em 2006, doou cerca de 46 mil títulos, entre livros e panfletos, para a biblioteca da USP, a Brasiliana. Seu acervo, hoje, é patrimônio nacional. Não posso deixar de considerar que um homem que coleciona livros, que tem na literatra sua maior paixão e que acredita na cultura e no conhecimento como forma de progresso, não seja um Senhor exemplo. Os livros me preenchem como preencheram Mindlin em vida. Meu conteúdo é o conteúdo dos livros que li e dos que ainda lerei. As lombadas das publicações em minha estante são meu horizonte. É pra lá que eu vou. Quero recomendar um livro escrito pelo Senhor exemplo: "No Mundo dos Livros", editora Agir. O livro tem 103 páginas, mas é nelas que Mindlin nos conta os exemplares que tem em sua estante e suas opinões sobre alguns de seus clássicos prediletos. Também nos ensina o que a escola não nos ensinou: o exercício de escolher o que ler e como ler, e como este exercício trará a paixão pelos livros e criará uma blibioteca interna, pessoal, íntima. Esta biblioteca interna estará cheia de afeto entre nós e nossos personagens, títulos e autores preferidos, transformando-nos em um ser único e com opinião literária. Mais ainda, em homens dignos e inteligentes. Compartilho com Mindin o mesmo medo que ele tinha enquanto vivo: que o tempo será curto para lermos tudo o que desejamos. Quero deixar uam mensagem de Mindlin, que tem a ver com exemplo..."Eu procuro, nos muitos contatos que tenho com a mocidade, inocular o vírus do amor aos livros, porque uma vez inoculado, está resolvido - a pessoa não se livra mais...". É isto. Sigamos o exemplo de José Mindlin e espalhemos o vírus da leitura. Divirta-se!

domingo, 25 de setembro de 2011

A estupidez da sabedoria

Este aparente "livrinho" do escritor francês Martin Page, "Como Me Tornei Estúpido", editora Rocco, que li há algum tempo, não tem nada de diminutivo ou, muito menos, de estúpido. Page nos apresenta um protagonista inteligente, com qualificações culturais específicas e simpático. Porém, seus conhecimentos e capacidade intelectual nunca o levaram a ter sucesso reconhecido, e aí está a base de um romance curto e deliciosamente atraente. O herói de nosso romance resolve, então, tornar-se estúpido e investir na idiotice para ser aceito pela sociedade e sobreviver. Nada mais antigo e atual do que se discutir o valor do conhecimento e sua definição, bem como sua utilidade. Ter conhecimento pode nos leva a um certo sofrer, pois cultura nos dá raciocínio, dissertação e opinião. Segundo o romance, a questão maior não é você apontar as idiotices do mundo e de uma sociedade imbecil, mas sim a resposta que você dá a elas. Ele sugere um caminho que segue na contramão de tudo o que possuímos enquanto conhecimento para que, como idiotas, consigamos sobreviver em uma sociedade capitalista e com valores fúteis de consumo e de aparências. Mas, afinal, ser inteligente é ser excluído e sofrer? Como lidamos com nosso conhecimento numa época em que todos os dias surgem matérias que exigem especialização própria? Se, por acaso, sabemos demais, isto nos diferencia das pessoas de nosso convívio? Na verdade, não sabemos nada. Somos, sim, seres dotados de inteligência que deve ser usada para convivermos com mais harmonia e que não deve ser um instrumento separatista ou de exclusão. Acredito na diferença entre as pessoas de um grupo ou de uma sociedade enquanto interesses e estilos de vidas próprios, mas não acredito na superioridade de alguém sobre o seu semelhante. Quanto mais sabemos, maior a dúvida. Um aprendizado leva a outras perguntas. Quando você obtém uma resposta, ela já não possui valor algum. Conhecimento é reconhecer que você não sabe algo. O livro de Page parece nos dizer que devemos ser imbecis para vivermos melhor. Na verdade, seu conselho é o oposto disto: não conseguimos ser estúpidos, pois não nascemos para tal. A sabedoria nos traz convivência pacífica e progresso saudável. Divirta-se!

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Técnicas de escrita e de sexo

Li, recentemente, um conto de Ricardo Lísias publicado na "Granta em Português" no. 6 (já mencionei as edições da Granta aqui, no Vide Letra) que aborda o fascinante tema da técnica literária. O conto se chama "Fisiologia da Solidão" e o tema da mencionada edição da Granta é o sexo. Sim, todos os contos desta edição da Granta remetem ao sexo de alguma maneira, porém sexo é um assunto que quero tratar em uma outra oportunidade. O importante neste conto de Lísias é o sentido que ele dá ao ato de escrever e a analogia que ele faz deste ato com o sexo. Magnificamente, ele diz que sua  técnica literária (sua ou do protagonista, pois acho que o texto, em alguns momentos, soa como uma confissão) é como um ato de solidão. Não aquela solidão triste, sem companhia, mas a solidão amparada e suportada pelas diversas técnicas literárias que ele tem enquanto escreve e se experimenta, haja vista que, segundo ele nos conta, sua melhor forma de expressão é a escrita. As alterações de técnicas literárias fazem com que ele (autor ou protagonista, vai saber) suporte a solidão. A comparação com o sexo vem, de forma brilhante, quando ele diz que realiza pequenas mudanças na maneira que escreve, quase como uma obsessão. Faz estas mudanças repetidamente e com variações mínimas. Tanto o sexo como a técnica literária são, para este escritor (ou para o protagonista) atos repetidos com pequenas alterações em sua forma. Achei isto explêndido! Para quem gosta de escrever e/ou ler, o prazer de um texto são atos de amor e de necessidade fisiológica, como o sexo. O tesão que consome um leitor voraz é de uma intensidade comparável com o gozo do sexo. Concordo, particularmente, com Ricardo Lísias em seu conto. Ter a companhia da técnica literária, com suas possibilidades infinitas, e como ter o sexo novo e renovado a cada encontro de amor. Divirta-se!

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

O coração da África

Falar do maior continente do planeta é nunca acabar de dizer o que se quer dizer. Falar de um lugar onde parece que o mundo ainda permanece virgem das ambições humanas, do progresso feio e da falta de fé é quase ser blasfêmico. Mas, como acabei de ler "O Coração das Trevas", clássico do romance que o escritor inglês Joseph Conrad publicou em 1899 em uma revista inglesa, arrisco-me a relatar a minha impressão sobre a África, mesmo sabendo que posso não estar a altura de citar tão nobres lugar e povo. O livro nos situa na época em que a colonização europeia predominava na África, no século XIV, por motivos comerciais (o marfim era o produto buscado), porém estes motivos eram vergonhosamente camuflados pelos falsos motivos do progresso. Os brancos chegaram como deuses poderosos, com suas embarcações e armas e escravizaram um povo ingênuo que vivia feliz e satisfeito. Fizeram o horror e deram inicio a escravidão. Os nativos eram tratados como peças de trabalho e, mortos de fadiga, eram jogados fora. No livro, um branco foi tratado como mágico e divino pelos africanos, e sua sombra se estende por toda a narrativa, mesmo que ele só venha a aparecer nos momentos finais da história. Seu nome é Kurtz (Marlon Brandon o viveu na versão da novela para o cinema). Kurtz representa o poder que o homem branco tem sobre os homens simples da África. Não sei se esta história acabou. Digo, a história da escravidão. Vejo meus irmãos africanos, simples, humildes, religiosos, com lindas crenças (eu diria invejáveis crenças) sofrendo por terem seu território explorado ao longo dos anos sem nenhum agradecimento dos "civilizados" exploradores. Ao meu ver devemos, no mínimo, nossa essência à África. É de lá que todos nós viemos. Foi lá que surgiu a religião que nos ampara quando precisamos. Foi na África que o mundo começou. Basta olhar para aquele lindo continente e para sua natureza pré-histórica. Não há, ninguém, que diga que a África é feia. Temos paixão pelas suas paisagens e pelos olhos de seu povo. O coração da África sofre de saudade do tempo em que nós não o conheciamos. Como disse, não sei se tenho o direito de falar de um lugar tão especial, mas tenho a obrigação de agradecer à mãe Àfrica por toda a pureza que ela colocou em minhas crenças e pela fé que só ela sabe ter. Fé esta que, ternamente, ela me mostra como conseguir. Divirta-se!

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Diga-me o que escreves e eu te direi quem és

Na "Revista da Cultura" edição 50, mês de setembro (para quem não sabe, a Livraria Cultura publica uma revista mensal que é bem legal), há uma matéria ótima sobre a relação entre a vida e a obra dos escritores, ou seja, como suas opiniões contribuem para formar a imagem que eles nos transmitem. É natural que tenhamos uma ideia sobre os autores depois que conhecemos sua obra. A opinião popular tende a achar que o autor tem inclinação para ser comunista, por exemplo, se ele escreve sobre este assunto, ou que é antissemita se defende Hitler e vocifera contra os judeus. Em panfletos, entrevistas ou romances, os argumentos autorais grudam no autor e o classificamos como adepto do que ele próprio escreveu. Mas, podemos levar ao pé da letra que uma obra é a personalidade de seu autor? Em alguns casos, sim. Nosso Jorge Amado foi perseguido por celebrar Stálin e por sempre manifestar seus sentimentos políticos em livros. E ele era, realmente, defensor dos ideais comunistas. A "Revista da Cultura" menciona, também, o escritor francês Céline, que era, declaradamente, antissemita e sua obra mostra a veracidade disto. Porém, há autores que declaram o contrário. José Saramago sempre firmou que, em seus livros, quem nos fala são os personagens e não ele. Fernando Pessoa vai além. Segundo o poeta português, que não era ninguém sendo muitos (palavras dele), sua maneira de escrever era através da auto psicografia (definição dele para seu estilo) de Caeiro, Ricardo Reis, Álvaro de Campos, Bernardo Carvalho, apenas para citar alguns dos seus 127 heterônimos (ufa!), todos com opiniões bem particulares. O que dizer sobre isto? É possível um autor desprender-se de suas crenças e escrever como outrem? Se sim, que qualidade teria uma obra que não tem um pouquinho do âmago de seu criador? Que arte pode ser feita sem um toque da alma do artista? O artista é tão artista que consegue fingir ser artista? Olha Fernando Pessoa de novo (o poeta é um fingidor...). Não acredito que a escrita esteja separada do coração de seu escritor. Só com o coração tocamos a alma de nosso interlocutor, seja falando, escrevendo, cantando, recitando, etc. E você? Como escreve? Divirta-se!

sábado, 10 de setembro de 2011

O fim do livro?

Li, esta semana, em uma matéria de jornal, sobre a era digital e, consequentemente, sobre o e-book. Vários movimentos apontam para, aparentemente, o fim do livro em seu formato tradicional. Várias bibliotecas, de vários lugares do mundo, estão disponibiizando seu acervo em formato digital. Segundo a matéria que li, as vantagens são inúmeras. Livros poderão ser consultados de qualquer lugar, a qualquer hora e através de vários perféricos (tablets, PCs, notes, celulares, etc). Livros de qualquer categoria e de qualquer região estarão em suas mãos com apenas um toque em seu aparelho eletrônico. Melhor ainda: você poderá lê-los no ônibus, no trabalho, em sua poltrona, na sala de espera de um consultório e até mesmo em alto mar. Isto sem mencionar que, além dos livros, jornais, revistas e quaisquer tipos de periódicos também caberão nestes aparelhos revolucionários da era pós-internet. Não há como negar a facilidade, o conforto e o ganho que teremos com estas possibilidades. Este blog é um exemplo disto, diga-se de passagem e eu estou muito feliz de poder contar com estas inovações. Mas quero sugerir uma leitura (no formato livro tradicional), de um livro feito à duas mãos, pelo escritor italiano Umberto Eco e pelo seu amigo e jornalista francês Jean-Claude Carrière. Chama-se "Não Contém com o Fim do Livro", editora Record. São 269 páginas deliciosas sobre a história da literatura e, obviamente, sobre o possível desaparecimento do livro em papel. Para meu rigozijo, eles afirmam: o livro em papel não acabará, assim como a fotografia não matou o quadro e a televisão não matou o cinema. Digo que regozijei porque sou devoto do formato livro encadernado, aquele que possui um perfume próprio que você, leitor voraz, saberá ao que me refiro. Os escitores ainda possuem um argumento que, em minha modesta opinião, encerra a questão: nosso bom e velho amigo livro não precisa de bateria, nem tampouco de pilhas. Não precisa de um programa compatível para ser aberto e lido e, principalmente, nunca precisará ser transformado em um outro tipo de periférico para poder ser utilizado, como aconteceu com a fita em formato VHS que, hoje, são praticamente inúteis. O livro sempre estará disponível, mesmo sem qualquer tipo de energia (solar, elétrica, eólica, etc). É durável e, bem cuidado, infinito. Mostra-nos a história da humanidade através de papiros e códices sem que tenhamos a obrigação de transformá-los em algum programa eletrônico atual para lê-los e apreciá-los. Sendo assim, que venham as novidades e os novos "brinquedos". Isto apenas aumenta o leque de possibilidades de leitura. Para quem tem amigos livros em papel como eu, nosso novo amigo e-book só veio aumentar a família. Divirta-se!

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Sopa-de-letras...e de amigos!

A culinária sempre foi uma arte deliciosa em vários sentidos: ela reune pessoas, mostra costumes de um lugar e, sob vários aspectos, acalma e tem poder terapêutico. Há romances que remetem à culinária. Acho que o mais famoso é "Nem só de Caviar Vive o Homem" do austríaco Johannes Mario Simmel, uma aventura pseudo-espiã na segunda guerra, onde Thomas Lieven faz maravilhas na cozinha, mesmo com o recesso de ingredientes. Pasmem: todas as receitas experimentadas no livro estão, na íntegra, em suas páginas. É uma delícia lê-lo e partcipar da aventura cozinhando juntamente com nosso protagonista. Eu gosto de cozinhar. E gosto, principalmente, de compartilhar meus sabores com meus amigos do coração. Garanto: não há prazer maior do que unir amigos, comida e papo sobre literatura em um prato quente de sopa-de-letrinhas. Juntar tudo na mesma panela. Todas as letras cabem em um churrasco, em um risoto regado a vinho, em uma massa. Costumamos citar livros, poesias e dar opinião sobre tudo o que lemos. Trocamos sugestões e brincamos de adivinhação. A brincadeira da adivinhação é a seguinte: um de cada vez deve citar o tema principal de um livro que já leu e, quem acertar o título e o autor, será o próximo a lembrar de algum livro que o tenha comovido. Quer um exemplo? Vamos lá: Homem desconfia que foi traído pela mulher quando repara que seu filho tem os traços de seu melhor amigo. Adivinhou? Resposta: Dom Casmurro, de Machado de Assis. Quer outra? Rapaz vai visitar primo que está se tratando de uma pneumonia e descobre que ele próprio está doente. Sabe que obra é esta? He he he,,,Se você não sabe, não vou lhe dizer. Você vai ter de adivinhar. Se não souber, já é uma ótima desculpa para reunir as pessoas que lhe são queridas e jogar com elas. Você vai ver que é uma delícia ímpar dividir a sopa-de-letras com seus amigos. Escolha uma receita, chame as pessoas e mergulhem na sopa! Divirta-se!

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Por que leio?

A pergunta parece óbvia, fácil de responder, mesmo quando a faço para mim mesmo. Leio porque gosto. Simples. Será tão óbvio assim? Sim, é claro que gosto de ler, a resposta não está errada. Ela só está incompleta. Aliás, sempre estará. Há coisas que meras palavras não definem ou não mostram, na totalidade, o que se quer dizer. A literatura, para mim, é assim. Não há definição cabível em uma única resposta. Ler, permite-me um mundo de possibilidades infinitas. Mas tentarei matar a charada. O que me passa pela cabeça e pelo coração, defronte de um romance, é sentimento, explicável com muito custo a quem queira dividi-lo comigo. O livro-viagem faz-me companhia de bordo; o livro-diário apresenta-me o interior de alguém; o livro-romance aventura-me por terras quaisquer; o livro-suspense mostra-me as sombras do meu irmão humano e, consequentemente as minhas; e por aí vai. Nas horas em que não me é permitido ler, fico aflito, preso a uma realidade de difícil diálogo. O barulho que vem da janela, as vozes que estão ao meu redor e os sintomas do dia fundem-se ao livro que, por ventura, eu esteja lendo. Quando leio, acredito que a realidade literária exista, pois, de outra forma, não estarei lendo. É necessário acreditar nos romances, principalmente nos romances. É fundamental que se acredite no que se lê, pois, somente assim, a leitura existirá.. Outro dia, em uma reunião com amigos, discutíamos quais livros têm, realmente, boas qualidades literárias. Opinei que todos, sem julgamento profundo, as tem. Todo livro lido como se deve, é divino. Quando se sente o espaço dos romances, quando se convive com os personagens e quanso se respira o mesmo ar das histórias, a mágica acontece. O livro passa a ter um significado quase essencial em nossas vidas. Ele é cheiro, é comida, embriaga e acalenta. Por isto tudo, eu recomendo: leia. Tenha, algumas vezes, a companhia de um livro. Leve-o para jantar ou para a praia. Pegue-o pela mão quando estiver entrando no ônibus ou na sala de espera do consultório. Troque olhares com ele e deixe que ele também o veja. Depois me responda: por que você lê? Estou curioso e ansioso pela sua resposta. Divirta-se!

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

O fantástico em nós

Hoje o escritor argentino Jorge Luis Borges completa 112 anos. Sim, completa, pois, sendo um Sr Fantástico, tanto ele como sua obra estão mais vivos do que nunca. Até 1986, ano de sua "suposta" morte, o Sr Fantástico tratou de construir, através de seus poemas, ensaios e contos, um mundo imaginário, cheio de deuses e seres maravilhosos com o intuito de mostrar-nos quem ele era e o que somos nós. Fantásticos. Deu-nos uma identidade, catalogou-nos como múltiplos. Com sua veia latina, privilegiou a memória da palavra. Transformou a escrita em ser mutante, aplicável a toda época e para sempre. Toda palavra é efêmera e mutante, isto sim. E permanente. assim mesmo, tendo esse cheiro paradoxal. Com suas torres de Babel e suas bibliotecas de Alexandria, uniu e definiu o homem comtemporâneo. Tudo em nós está em suas obras. A obra de Borges é o prórpio Borges. Equação indivisível. Assim como Fernando Pessoa é, de alguma maneira, menor que sua própria obra e nada sem ela, Borges salta de seus textos e se materializa a nossa frente. Sem sua palavra, ele não existe. E nem nós. Ele nos transforma, ou melhor, faz com que tenhamos consciência de nós mesmos. Obriga-nos a olhar para dentro de nosso espírito e enfrentá-lo, conhecê-lo. Exemplo: em "O Livro de Areia", no conto "O Outro", Borges encontra-se com ele mesmo em um banco de alguma praça em Boston. O diálogo que se inicia, após uma certa irritação de Borges pelo novo companheiro vir tirá-lo de sua paz solitária, é uma amostra do que Borges consegue transmitir-nos: a conversa com nosso interior, nossos questionamentos e lutas pessoais e, principalmente, nossas lembranças, que nos fazem companhia quer a queiramos vivas ou não. Este conto remete ao livro "O Duplo", de Dostoiévski, escritor que melhor conseguiu definir a alma humana. Mas, antes de acharmos que Borges está plagiando o escritor russo (eu estava tendo esta impressão no início do conto) ele cita a obra de Dostoiévski ao seu interlocutor, em uma linda passagem sobre a memória. Sobre a morte, vale citar outro trecho do conto mencionado: "Que ninguém se perturbe por uma coisa tão comum e corrente". Este é Borges. Depois dele, nos transformamos em seres fantásticos, em deuses do impossível. Sendo assim, nos transformamos em Borges. E que ele viva para sempre. Divirta-se!

domingo, 21 de agosto de 2011

A maldade da inocência

Já comentei sobre o tema a seguir aqui, no Vide Letra, quando citei a obra de Henry James, "Pelos Olhos de Maisie", onde acompanhamos o desenrolar da trama sob a ótica da criança Maisie que nos permite crescer, junto com ela, no entendimento da história. Em "Reparação", do escritor, também inglês, Ian McEwan, Cia das Letras, temos a perspectiva de uma história de amor contada através da imaginativa Briony, que no começo da narrativa tem 13 anos de idade. O que difere um livro do outro é que, em "Reparação", além do relato de Briony, os fatos são narrado, também, por outros ângulos: o de Cecília, sua irmã mais velha e nossa heroína, o de Robbie, filho da arrumadeira e grande amor de Cecília, e de outros personagens menores mas, nem por isto, sem importância na formação da identidade da história. O livro foi levado as telas de cinema e teve sete indicações ao Oscar. O filme é bom, mas não apresenta toda a imaginação de Briony como o livro consegue apresentar. Briony é aspirante à escritora desde criança. Escreve peças de teatro, dirige-as e sempre aborda o amor verdadeiro, as paixões que passam por crises e perigos para que, no final da história, vençam todo o mal e mentiras para serem "felizes para sempre". Por presenciar às escondidas uma situação intima entre sua irmã Cecília e Robbie, ela crê que este é o antagonista mal e doentio de suas histórias e que ele, com certeza, significa a ruína de sua irmã. Sente-se, assim,  na obrigação de reverter este quadro criminoso e defender sua "irmã princesa" das garras de Robbie. Na verdade, toda situação é criada em sua mente de jovem escritora e sonhadora do amor ideal e, em uma mentira "inocente", ela depôe contra Robbie levando os adultos que a interrogam a acreditar em sua versão. Com este fato, Briony acredita que está deixando a vida infantil e passando para a fase adulta, haja vista que sua palavra foi aceita pelos adultos. Briony, mesmo não tendo certeza do que presenciou, não volta atrás no que disse, pois isto representaria um descrédito que ela não gostaria de sofrer. Acaba, assim, por mudar o destino do amor entre Cecília e Robbie. Entres estes dois, a luta diária para manter vivo o amor e, literalmente, sobreviver (estão na inglaterra da segunda guerra) nos comove. Na história, realmente houve um crime de estupro e Briony aproveita a deixa para acusar o pobre Robbie e, assim, tirá-lo da vida de sua irmã Cecília para mantê-la salva. Briony, na fase adulta, arrepende-se e dedica-se a reparar, até o final de seus dias, o mal que causou aos dois e a um amor que ela sempre acreditou soberano. Uma maldade é uma maldade. Se há inocência em uma maldade, talvez seja a maldade de uma criança. Mas, e o horror causado por esta inocência, é perdoável? E os adultos que, por não terem outra opção, ao abraçarem o relato de uma criança leva um inocente a pagar caro por um crime que não cometeu, onde eles se enquadram? Chegamos ao ponto do julgamento. Briony criança julga com a intenção de ser aceita no mundo adulto. Os adultos julgam com a intenção de achar um culpado para o crime e aceitam o depoimento de uma criança. Por sua inocente maldade, Briony conseguiu destruir o futuro de todos. Por seu arrependimento, ela passa a vida tentando reparar o mal que causou a pessoas tão especiais de seu círculo. A ótica de uma inocente deve ser levada em consideração na medida de sua pureza e devemos ter a maturidade de analisar os fatos antes de julgarmos. Briony não é má. Briony foi inocente e sonhadora. Má foi a atitude dos adultos em acatar um depoimento infantil em busca de uma justiça rápida. Julgamento é destruidor quando não entendemos o grande universo que habita as pessoas que estão conosco nesta jornada. Viva a inocência com sua maldade infantil. Abaixo os que se utilizam dela para ganhar fácil. Divirta-se!

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

A Sra Esperança e o Sr Amanhã

Amanhã começo um processo novo em minha vida, Dei-me de presente o que há muito me devia: o acompanhamento de uma profissional para resgatar minha esperança em meu amanhã. Sempre acreditei no amanhã, porém esta ajuda irá fortalecer a minha crença e ordenar minhas prioridades. Tantos autores já falaram em "amanhã" e em "esperança" que estes dois personagens milenares acabaram se casando. Prosa, poesia, música, de todas as maneiras o casamento da Sra Esperança com o Sr Amanhã foi mencionado e tornou-se inevitável. É no amanhã que, apesar de hoje, teremos a estrada da esperança para se trilhar, como disse Guilherme Arantes em um lindo momento. Com este casamento, aconteceu um outro: o casamento da Sra Saudade com o Sr Passado. Dentre os dois casamentos, não há o mais importante e nem o mais bonito. Há a nossa opção de ponto de vista. Se a saudade for "um pouco como fome que só passa se você absorver o passado e, mesmo assim, o passado todo" como disse Clarice Lispector, talvez ela doa de uma maneira um tanto quanto incômoda. Ou de um jeito triste, como nos versos de Álvaro de Campos em que ele diz que "no tempo em que festejavam o dia dos meus anos, eu era feliz e ninguém estava morto; quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças". Acredito que os frutos oriundos destes casamentos dependam de nosso olhar. Nosso passado nos acrescenta, pois a saudade do que vivemos faz com que olhemos adiante com confiança. O amanhã nos dá esperança. É lá que está a tão almejada felicidade. E lá, no amanhã, que mora a sabedoria de quem viveu plenamente o hoje. Do casamento da Sra Esperança com o Sr Amanhã nascerão filhos saudáveis e fortes. Basta-nos fazer, hoje, a festa de celebração nupcial verdadeira com nós mesmos. Divirta-se!

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Deus, segundo o filho

Saramago não precisa de apresentações. Sua obra está aí para mostrar-nos sua fé. Saramago dizia-se ateu, mas, em duas obras suas, apresenta-nos temas cristãos. Estes sim, valem alguma apresentação. Em "Caim", seu último livro, uma leitura do antigo testamento é feita por Caim, o protagonista que questiona e enfrenta Deus. É mais do que humano questionar e lutar por conforto e sobrevivência, coisas que foram privadas de Caim por seu (nosso) Criador. Privações que Deus justifica como necessárias para o pagamento da dívida pecaminosa que Adão e Eva (pais de Caim) contraíram quando desobedeceram seu (nosso) Criador comendo da fruta proibida e tentadora que o próprio Deus havia criado. Já em "O Evangelho Segundo Jesus Cristo" (em minha opinião, seu melhor livro), é Jesus quem nos apresenta o novo testamento e sofre nas mãos de seu (nosso) Pai. Apesar de ser filho único de Deus, Jesus é o melhor instrumento para que Ele mostre-nos sua existência e poder. Saramago, o ateu, conhece bem os evangelhos e, por isto mesmo, tem opiniões muito próprias a respeito do fascínio de Deus sobre os homens e firma as eternas questões: Deus é bom? É vingativo? E tudo isto para que? Não há respostas certas. Depende de quem as responde. Deus pode ser qualquer coisa, para qualquer um. Não ser nada para alguns e, mesmo assim ser algo como, talvez, um simples nome ou um folclore. Pode ser muitos em um só. Para Saramago, Deus fez e usa suas crias como bem entende. Às vezes para lembrar-nos de Sua existência, às vezes para divertir-se e passar o tempo. Para nosso mestre português, Deus não responde os porquês. O mal, a morte, os sacrifícios são assim porque Ele decidiu que assim os fosse. Para mim, Deus é tudo aquilo que eu acredito que me faça bem. Deus é meus pais, meus amigos, meus livros. É também meus olhos, a água que mata minha sede, a paisagem na janela de meu carro. É a companhia de meu amor, é ficar de mãos dadas. Se Saramago era ateu (eu adoro a literatura de Saramago, que fique claro) como ele dizia ser, talvez ele apenas não colocasse o nome "Deus" em suas paixões e em coisas que ele admirasse ou criasse. Todo filho Dele, incluindo Saramago, tem por direito questionar as razões da vida, mas temos por obrigação achar Ele nas coisas que amamos e que justifiquem nossa existência e milagre. O Deus de Saramago era a escrita (acho que ele não sabia disto). O nosso Deus mostra-se, também, nas histórias de nosso amigo português. Tenho orgulho de ter opinião de filho de Deus. Divirta-se!  

domingo, 7 de agosto de 2011

O amado baiano

Já citei Jorge Amado aqui, no VIDE LETRA, mencionando uma obra sua que me arrebatou quando a li, que foi "Gabriela Cravo e Canela". A pureza e a beleza de Gabriela é uma das recordações mais doces que trago comigo. No dia 06 de agosto de 2011, fez 10 anos que Amado morreu. Para quem conhece um pouco da Bahia (eu estive lá quatro vezes) sabe que esse estado brasileiro é rico em magia e emana uma atmosfera própria de sonho e religião, características únicas que diferenciam nosso estado soteropolitano do resto do país (e do mundo). Adoro a Bahia e seus mares, praias, músicas e povos. Jorge Amado "pintou", com sua prosa, uma Bahia ainda mais alegre e viva, cheia de fé e mistérios, mais respeitosa em sua pureza do que qualquer outro baiano poderia ter imaginado. Há dez anos morria este senhor baiano que flertou com o comunismo e foi exilado do país por duas vezes. Várias obras suas foram parar no cinema e na televisão, aproximando o povo brasileiro cada vez mais de nossa Bahia. Com seus capitães de areia, com suas tendas dos milagres, com suas Gabrielas e suas Teresas Batistas cansadas de guerra, nosso amado Jorge firmou a Bahia como um estado provido de alma mágica e cativante, com suas cores, festas, crenças e delícias culinárias. Sou apaixonado pela Bahia. Quem anda por suas terras fica enfeitiçado só por respirar seus ares baianos. Ter contato com um nativo baiano é ter uma linda experiência de troca de sentimentos generosos e de alegria contagiante. Nosso Jorge está vivo para sempre no candomblé ritimado da Bahia. Divirta-se...Saravá!

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Sob a ótica das crianças

Leio desde criança. Foi uma das coisas que me transformou em um homem de raciocínio. A outra coisa foi a educação que meus pais, sabiamente, me deram. E sou grato a essas duas bases por minha formação que, apesar de estar longe de ser perfeita (graças à Deus!), fizeram de mim, um cidadão. Tenho a sorte de, até hoje, ter ao meu lado o amparo dessas duas forças. Meus pais e a literatura. Posso afirmar, convicto do que digo, de que são as coisas que mais amo. Orgulho-me disto. Na literatura, várias publicações têm como agente condutor da trama, a percepção de uma criança. "Pelos Olhos de Maisie", do espetacular Henry James talvez seja a mais famosa (a Cia das Letras lançou uma edição de bolso bárbara, com edição revista). Henry James apontou, em seu romance, algo novo para a época (1897): as crianças têm inteligência suficiente para tirar suas próprias conclusões e sabem mais do que imaginamos. Na história, nossa heroína Maisie tem de aprender desde cedo o que é o divórcio, pois seus pais entram em litígio pela sua guarda e pelos seus anseios mesquinhos. Desde pequena Maisie  muda de lares, conhece as diferentes e alternadas companhias masculinas de sua mãe (bem como tem de lidar com um amor ausente da mesma) e acaba crescendo em conciência e em idade pelas mãos de pessoas caridosas que lhe acompanham. O romance, magicamente, faz-nos perceber a vida e o mundo através da ótica desta menina meiga e adorável. Com sua sensibilidade e fé juvenil (sim! As crianças são cheias de esperança, pois têm um mundo enorme e uma vida longa pela frente. Elas sabem disso), Maisie sonha em ser feliz na companhia de adultos que sejam a figura de seus pais. Se você, leitor, lê desde criança, vai conseguir reconhecer em Maisie a criança que você era. Se você não lia quando era pequeno, não há problema. Nunca é tarde para começar. E não será tarde para conhecer Maisie. Ela é a criança que você foi. Viva. Linda. Esperançosa. Recheada de amor e sem ressentimentos. Querendo, apenas, um afago quente. Eu não tenho filhos, mas se os tivesse, eles seriam como pãesinhos quentes, crescendo em um forno cheio de fermento literário, onde o padeiro aqui, leria tudo do bom e do melhor para eles. Divirta-se!

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Abaixo os inimigos dos livros!

A coluna de J.R. Guzzo da revista VEJA desta semana, no. 2228, está ótima. Guzzo fala sobre os inimigos dos livros. Sim, eles existem. Na verdade sempre existiram ao longo da história de nossa espécie. Em épocas de guerra, queimam-se livros para que o povo não tenha acesso à informações que o deixaria apto a raciocinar sobre seu próprio destino, coisa que as guerras, quaisquer uma delas, têm medo. O raciocínio e a inteligência deixam os governantes frágeis, à mercê de seus comandados,  pois um povo que lê, não é gado. Não sendo gado, não é conduzido por caminhos que não são dele. A igreja, por exemplo, é uma das organizações que mais veta publicações e editoriais em prol de suas verdades, de seus dogmas, como se eles fossem soberanos e interessassem a todo mundo. Como Guzzo também coloca, a opinião pública não interessa, a rigor. Ela é sustentada em matérias pobres de leitura, haja vista que o acesso ao que se lê é medíocre e raso. Outro espanto é a usual colocação de que árvores são cortadas para se fabricarem livros, revistas, etc. São os inimigos dos livros se manifestando. Apoiam outros periféricos como instrumento de leitura (os tablets, por exemplo) e "acabam" com os livros, sem ao menos questionar o quanto é agradável ter um livro em mãos, o prazer de ter um companheiro que nunca precisará ter sua bateria carregada e poderá ser lido para todo o sempre, mesmo que a tecnologia avance cada vez mais. Já os "tablets" precisarão se adaptar logo logo. Quer ver como a leitura está em baixa? Veja o exemplo de Guzzo: experimente colocar, sob sua mesa de trabalho, o livro que você, atualmente, está lendo. Espere seu chefe passar por perto. Qual reação você acha que ele terá? No mínimo passará pela cabeça dele que você não está trabalhando e que, ao invès de focar em suas rotinas laboriosas, está desperdiçando tempo útil (e dinheiro!). Como Guzzo mesmo afirma, em entrevistas de executivos, não se levam em consideração se eles têm como hobbie a leitura, pois isto não agrega nada. Isto nas opiniçoes dos inimigos dos livros, que fique claro. Por isso, repare se você tem ao seu redor um inimigo do livro e livre-se dele. Como? Explicando a ele que, se ele nunca teve prazer em leitura, ele nunca teve prazer na vida.  Agora, dê uma olhada na foto que anexei a este post. Diga-me se existe lugar melhor no mundo para "viajar de primeira classe". A poltrona leitura é perfeita! Eu quero uma de imediato! Se bem que, pessoalmente falando, eu acrescentaria uma taça de vinho tinto a ela. E você? Acrescentaria o quê? Independente do que você adicionaria a nossa cadeira, uma coisa é certa: ela teria nossos melhores amigos, nossos melhores livros. Divirta-se!

terça-feira, 26 de julho de 2011

O "barco" de Neruda

Estive em Santiago do Chile na semana passada. Ainda não conhecia a cidade e confesso que me surpreendi. Santiago é uma cidade bonita, limpa, agradável para passear a pé e com lindos lugares que nos deixam felizes. Um dos lugares que mais me emocionou foi a casa de Pablo Neruda, poeta e nobel chileno que, além da casa em Santiago (você pode ver uma parte dela na foto que tirei - infelizmente no interior da casa não foi permitido fotografar) possuia, também, casas em Valparaiso e em Isla Negra. Tinha três paixões, pelo que vi e senti em sua casa: sua terceira esposa Matilde que, docemente, ele apelidara de "La Chascona" (A Descabelada), suas coleções de garrafas, bonecas, quadros e outros tantos objetos singulares (que você pode ver espalhados pela casa em uma harmonia incrível) e o mar. Particularmente, sua paixão pelo mar era tão intensa que Neruda desenhou e construiu sua casa em Santiago com ares de uma nau, como se ela fosse realmente uma embarcação e tudo ao redor dela fosse o mar. Há vários motivos náuticos compondo um ambiente aconchegante junto com móveis espetaculares. Os tetos são baixos, as varandas parecem proas (veja a foto, não lembra um barco?), os assoalhos de madeira, em alguns recintos, são inclinados para que tenhamos a sensação do "balanço do mar". Mas o que mais me fascinou foi a sala de jantar: com teto baixo, as mesa e cadeiras estão quase rentes ao chão e, defronte, há uma ampla janela que dá para um pequeno pátio que, em dias de chuva, alaga e trasnmite a sensação ao espectador, que está jantando, de que ele "navega". Incrível! Infelizmente, em 1973, muitos objetos de suas coleções, bem como móveis e livros, foram queimados pelo exército da ditadura de Pinochet. Mas, como tudo que é divino não se extingue por forças ignorantes, o espírito de Neruda e de sua casa ainda vivem. Estão lá seus livros, sua poesia, seus amigos (Jorge Amado, Vinícius, Prestes estão entre eles) e sua alma. Respirando em sua casa, com os olhos e com o pulmão, podemos ter momentos ricos de prazer. Uma dica: quando puder, visite a casa de Neruda, leve um livro de suas poesias, sente-se em um banco de seu jardim e navegue. Divirta-se!

quinta-feira, 14 de julho de 2011

A metade essencial

Para ser inteiro precisamos, pelo menos, ser duas partes, pois, do contrário, não há inteiro. Não há nada. As partes formam um todo que, só é todo, porque pode ser dividido em, no mínimo, duas partes. Italo Calvino escreveu "O Visconde Partido ao Meio" em 1952 para, junto com outras duas obras suas (O Barão nas Árvores e O Cavaleiro Inexistente) formar a trilogia que define o homem comtemporâneo, em contos fantásticos, inspirados na psicologia Freudiana. Nosso Visconde é, literalmente, partido em dois por uma bala de canhão em uma batalha. Uma das partes fica com seu lado bom, a outra com seu lado mesquinho e mal. A partir desta divisão, tão real quanto imaginária, dois mundos opostos entram em conflito e tentam sobreviver. Sim, sobreviver. A parte mesquinha está impossibilitada de amar, de ser compreensível, de tornar as coisas belas. Já a parte boa não consegue lutar, progredir, ir contra as ações da vida que, aparentemente, parecem ruins, mas na verdade é o que nos move. Sem o equilíbrio do bom e do mal, do escuro e do claro, os extremos não servem para nada. O que nos torna humano é o que possuímos de mais rico: nossa heterogeneidade. Somos bons, mas não podemos deixar de ser ambiciosos saudavelmente. Nosso senso de bom, de correto e de justo só é possível quando existe uma analogia entre o oposto disso tudo. Se ajo de maneira correta é porque sei que, às vezes, tenho atitudes erradas. Não posso ser bom se não possuo uma metade mais agressiva, pois, do contrário, eu não seria nada. Ser humano é ter metades diferentes, é ser vários. Sendo honesto, inclusive consigo mesmo, já nos torna especiais. O equilíbrio nos mantêm em pé, conciente e vivos. Tire-se uma dessas metades, e tombaremos. Aquela metade que tantas vezes procuramos no externo pode estar conosco. Para ser todo, saiba conpletar-se e tenha s sua metade essencial. Lembrei deste livro hoje, conversando com uma amiga querida. Divirta-se!

segunda-feira, 11 de julho de 2011

A cachorra que nos emociona

Há tempos quero mencionar este livro aqui, no Vide Letra. "Vidas Secas" de Graciliano Ramos é mais uma homenagem e um agradecimento meus a esta obra do que uma indicação de leitura. Gosto de mencionar autores nacionais por que acredito que a alma do brasileiro, de tão surrada, de tão experiente em sobreviver, atinge um nivel de expressão tão autêntico e nítido que é como se encostassemos o ouvido do lado direito do peito e ouvissemos o pulsar da vida. A família protagonista deste romance (pai, mãe, dois filhos pequenos e a cachorra Baleia) foge da seca nordestina como se fugisse dela mesma e de sua existência. A relação dos entes, incluindo-se nesta relação a cachorra Baleia (sim, é o nome mais marcante do romance, por isto permito-me mencionar apenas ele, mesmo porque as crianças não têm nome) é de caminhar. Caminhar para um não sei. Para um horizonte onde, espera-se, reside uma esperança de bem-viver. É um romance grandioso e triste, como toda obra profunda deve ser: grandiosa e triste. Mas quero falar sobre a cachorra Baleia: ela sente, sonha, ama, é companheira e...sofre. Mais do que qualquer outro personagem, ela nos é apresentada por Graciliano como o elemento que nos mostrará o âmago do romance. É nela que podemos sentir a verdadeira aflição que os humanos se submetem. Humanos que vivem em condições animalescas e que, talvez por isto mesmo, a cachorra é que tenha a voz mais latente no livro. Lembro-me de que este livro e Baleia me tocaram tão verdadeiramente que por alguns momentos achei que não fosse conseguir continuar com a leitura. Mas consegui. A gente consegue o inimaginável quando queremos algo. Foi assim com a família de Vidas Secas. Foi assim com Baleia que, com amor e acreditando em sua família itinerante (mesmo não crendo no que, às vezes, seu próprio dono fazia a ela) conseguiu chegar aos céus dos cachorrinhos. Divirta-se!

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Poesia para Deus

Não conheço muito de poesia. Posso, inclusive, dizer que meu contato com poesia não vai além de Fernando Pessoa e seus heterônimos (o que já é grandioso). Mas, um dia, em uma livraria aqui, em São Paulo, flertando com tudo que é livro como de costume, avistei o livro de Adélia Prado "A Duração do Dia" editora Record. Acredito que foi o livro que me achou. Coincidentemente, a autora tem o mesmo nome de minha mãe, um desses nomes antigos, marcantes e lindos. Nome único, como minha mãe e a poesia de Adélia Prado. Eu e o livro nos apresentamos um ao outro como velhos conhecidos. Depois nos tocamos, em cumprimento modesto e tímido. Convidei-o para conhecer minha casa e, para minha alegria, ele aceitou. Foi assim que a poesia desta linda senhora mineira, que lançou seu primeiro livro com 40 anos de idade e já mãe de cinco filhos, ficou comigo. Adélia faz analogia entre poesia e experiência religiosa. Em sua opinião, as duas são experiências idênticas. Para ela, tanto a poesia quanto a fé nos leva para o mesmo lugar. Acho que por esta razão seus poemas lembram Deus e, muitas vezes, são direcionados a Ele. Como ela mesma afirma, ela só tem seu cotidiano e seus sentimentos. A poeta que foi apresentada a Drummond e que, maravilhado com o seu trabalho indicou a publicação de seus poemas, faz coisas lindas como esta: "Não há culpados para a dor que eu sinto. É Ele, Deus, quem me dói pedindo amor, como se fora eu Sua mãe e O rejeitasse. Se me ajudar um remédio a respirar melhor, obteremos clemência, Ele e eu. Jungidos como estamos em formidável parelha, enquanto Ele não dorme eu não descanso". Como disse, não conheço nada de poesia, mas sei sentir quando algum ato divino como este me envolve. Ah! O livro que veio comigo para casa? Moramos juntos até hoje e, às vezes, ele dorme comigo. Divirta-se!